Tem-se passado a imagem da filosofia patrística e a
escolástica que predominaram na idade média, como servas da religião e para a
justificar, produzida em mosteiros por padres que desejavam manter a população
na mais completa ignorância. Ignora-se no Brasil sistematicamente a filosofia
medieval em prol da filosofia moderna se dando ênfase a pensadores como
Descartes, Spinoza, Kant, Hegel e etc. Infelizmente muito do conhecimento tem
sido negado ao povo brasileiro em prol de um certo autoritarismo acadêmico,
principalmente da USP que de legado marxista positivista prefere impor ao
brasileiro autores como Karl Marx e Rudolf Carnap.
A filosofia do período medieval era mais
independente da religião do que hoje a filosofia hoje em relação a ciência,
quando a filosofia tornou-se serva da ciência.
Respostas a problemas da modernidade poderíamos encontrar
nas obras de Santo Tomás de Aquino, Santo Agostinho, São Boaventura, Santo
Anselmo de Aosta e tantos outros grandes autores. Infelizmente ela sofre um
preconceito graças a caricatura que os iluministas fizeram dela, sem ao menos a
conhecer.
Falarei aqui da ética de Santo Tomás de Aquino que
nos dá ótima soluções sobre a questão do direito e da justiça, se ambas devem
andar juntas ou se são separadas e respostas a ética pragmática.
A
ética tomista:
Santo Tomás de Aquino distingue três tipos de leis:
a Lex aeterna, a lex naturalis e a lex humana.
E acima delas esta a lex divina, ou
seja, a lei revelada por Deus. A lex
aeterna é o plano racional de Deus, a ordem do universo inteiro, pela qual
a sabedoria divina dirige todas as coisas para seu fim. E o plano da
Providência conhecido unicamente de Deus e de poucos eleitos. Entretanto, ha
urna parte dessa lei eterna da qual, como natureza racional, o homem é
participe. E tal partecipatio legis
aeternae in rationali creatura é definida por Tomas com o nome de lei
natural.
Em suma, enquanto seres racionais, os homens
conhecem a lei natural, cujo núcleo essencial esta no preceito de que "se
deve fazer o bem e evitar o mal". Para o homem, como para todo ente, a sua
própria conservação e um bem. Para o homem, como para todo animal, e bem seguir
os ensinamentos universais da natureza: união do macho e da fêmea, protegido e
crescimento dos filhotes etc. Para o homem, enquanto ser racional, é bem
conhecer a verdade, viver em sociedade etc. Entretanto, mais do que
especificação do que é e o bonum e do
que o malum, ele vê a lei natural principalmente como forma da
racionalidade.
Estreitamente ligada a lex naturalis, Tomás considera a lex humana. Trata-se da lei jurídica, isto é, o direito positivo, a
lei feita pelo homem. E os homens, que são sociáveis por natureza, fazem as
leis juridicas para dissuadir os indivíduos do mal. E como toda lei é aliquid pertinens ad rationem (isto é,
algo que pertence à razão, uma vez que pertence a razão estabelecer os meios
para os fins e ver a ordem dos fins), a
lex humana e a ordem promulgada pela coletividade (multitudo) ou por quem tem a responsabilidade pela comunidade (ab eo qui curam cornmunitatis habet),
tendo em vista o bem comum.
Entretanto, como acenamos acima, as leis feitas pelo
homem se baseiam na lei natural. Com efeito, na opinião de Tomas, alei humana
deriva da lei natural de dois modos: por dedução, isto é, per modum conclusionum, ou por especificação
de normas mais gerais, isto é, per modum
determinationis.No primeiro caso, temos o jus gentium, no segundo o jus
civile.
Assim, a proibição do homicídio é parte do jus gentium, mas o tipo de pena que deve
ser reservada ao homicida e parte do jus
civile, pois se trata da aplicação hist6rica e social de urna lei natural
especificada e fixada pelo jus gentium.
Sendo derivados logicamente da lex
naturalis, os preceitos do jus
gentium podem ser conhecidos independentemente de urna pesquisa histórica
sobre os diversos tipos de sociedade, ao passo que, evidentemente, o mesmo não
vale para os preceitos do jus civile.
Se os preceitos da lei humana ou positiva são derivados da lei natural, eles
são conhecidos pela razão e estão presentes no conhecimento. Desse modo, a
sociedade poderia até não fixa-los na lei humana ou jurídica. Entretanto, nós
os encontramos estabelecidos no direito. E isso se dá porque existem
"pessoas propensas aos vícios e neles obstinadas, e dificilmente podem ser
guiadas pela persuasão. Assim, é necessário que sejam obrigadas pela força e
pelo temor a evitar o mal, para que, abstendo-se de fazer o mal pelo menos por
esse motivo, deixem os outros em paz e, finalmente, por esse habito de evitar o
mal, sejam levadas a fazer voluntariamente o que antes só faziam por medo,
tornando-se assim virtuosas".
A coerção exercida
pela lei humana, portanto, tem a função de tornar possível a convivência
pacifica entre os homens, embora para Santo Tomás de Aquino ela tenha também
função pedag6gica. A lei humana, portanto, pressupõe homens imperfeitos. E como
ela não reprime todos os vícios, mas somente os "que prejudicam os
outros" e que, como "os homicídios, os furtos etc.",
"ameaçam a conservação da sociedade humana", da mesma forma "não
se precisa ordenar todos os atos virtuosos, mas somente aqueles que são
necessários ao bem comum".
Se a derivação da lei natural é essencial para a lei
humana, então é evidente que, quando urna lei humana contradiz a lei natural,
nesse caso ela não existe como lei. Essa é a razão pela qual a lei deve ser
justa. A exemplo
de santo Agostinho, também para Santo Tomás "não parece que possa haver
lei se ela não for justa". Se uma lei positiva estivesse em desacordo com
a lei natural, então ela "não seria mais urna lei, mas uma corrupção da
lei".
Para Santo Tomás de Aquino, a lei humana é moralmente válida
quando deriva da lei natural. Na opinião de Santo Tomas, as leis jurídicas
injustas são "mais violência do que leis".
Entretanto, considera ele, tais leis podem até ser obrigatórias, mas somente
onde seja necessário "evitar escândalo ou desordem". Em todo caso,
porém, é preciso sempre desobedecer a lei injusta se ela for contra a lei
divina positiva, impondo a idolatria, por exemplo. E também é justificada a
rebelião contra o tirano.
Podemos enfrentar um dilema, quando precisamos violar
a lei para nos preservarmos ou a alguém, como matar em legitima defesa.
Santo Tomás de Aquino elaborou teoria do duplo. Ela
visa explicar em que circunstâncias é permitido tomar uma ação tendo ao mesmo
tempo consequências positivas e negativas (ou seja, um duplo efeito). Ela
enuncia diversas condições necessárias para que uma ação possa ser moralmente
justificada mesmo quando comporte um efeito ruim:
- A ação deve ser ela mesmo boa ou moralmente
neutra;
- O efeito positivo deve resultar do ato e não do
efeito negativo;
- O efeito negativo não deve ter sido diretamente
desejado, mas deve ter sido previsto e tolerado;
- O efeito positivo deve ser mais forte que o
negativo, ou ainda, ambos devem ser iguais.
Em suma, esta tese sustenta que existem situações
onde é justificado produzir uma consequência ruim se ela é apenas um efeito
colateral da ação e não intencionalmente buscado.
Tem o caso de matar alguém por legítima defesa. A
intencionalidade é se manter vivo, pois tudo tende a se conservar no ser
enquanto pode, isso é natural e é moralmente lícito para São Tomás.
Outro exemplo relevante seria o do aborto legal. A intenção
não é matar a criança, mas quando a mãe corre risco de vida, preservar a vida
desta e ao matar a criança se preserva a vida materna, de maneira nenhuma abre
caminho para o aborto irrestrito.
Conclusão:
Com a ética tomista aprendemos que a lei humana e a
justiça (lei natural) devem andar juntas, porque a finalidade da lei é o bem-estar
da sociedade e a ordem social, não a vontade de um governante ou do Estado.
As leis são feitas com base numa virtude cardial que
diz aonde deve caminhar a lei e que sua violação só pode ocorrer
excepcionalmente e só quando sua ação negativa gerar uma ação boa.
A validade do tomismo está em que toda lei deve visar
a felicidade da sociedade e coibir determinados abusos do ser humano,
permitindo a convivência entre as pessoas e que o direito de todos deve ser
respeitado.
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